Bebida aromática, de forte sabor, estimulante do sistema nervoso, o café é hoje um hábito disseminado por todo o mundo e sua produção e comercialização têm peso relevante na economia internacional, constituindo um dos principais produtos de exportação de cerca de quarenta países menos desenvolvidos.
Café é fruto do cafeeiro, arbusto da família das rubiáceas, gênero Coffea, do qual existem mais de sessenta espécies e inúmeras variedades, podendo chegar a até dez metros de altura. As principais espécies de importância econômica são a Coffea arabica e a Coffea robusta ou canephora, sendo a primeira de maior cotação no comércio internacional por suas qualidades de aroma e sabor.
A planta cultivada cresce bem menos do que em estado nativo mas fornece maior quantidade de frutos. O caule tem casca cinzenta e rugosa e as folhas, agudas e onduladas nas margens, são verde-escuras; possui flores brancas, que se unem em cimeiras na axila das folhas superiores. O fruto, baga ovoide, é vermelho quando maduro e quase preto depois de seco, e contém duas sementes, achatadas ou ovoides, revestidas de tegumento amarelado ou acinzentado.
Além do consumo universal da infusão, o café tem outras aplicações, já que, por conter cafeína e outros alcalóides em sua composição química, atua no sistema nervoso e circulatório, estimulando a atividade cerebral e cardíaca, além de servir como diurético. É empregado contra dor de cabeça, embriaguez, asma, tosse e como antídoto do ópio e da morfina. Em algumas regiões do Brasil, as folhas do cafeeiro, usadas em forma de banhos, combatem os resfriados e reumatismos. Entretanto não tem valor nutritivo e, se consumido em excesso, pode causar gastrite, nervosismo e alterações no ritmo cardíaco. O resíduo da infusão serve como adubo.
Origem do café. A história do café é vaga e obscura. A palavra café parece derivar do árabe qahwah, embora etimologistas a relacionem com Kaffa, província da Etiópia de onde a planta é nativa. De lá passou para a Arábia e admite-se que os árabes hajam começado a tomar café já no século XV. O cultivo se desenvolveu e o Iêmen permaneceu como principal fornecedor mundial até o século XVII.
Uma das lendas em torno da descoberta do efeito estimulante do café é a do pastor Kaldi. Ao ver a agitação das cabras de seu rebanho, após a ingestão de alguns frutos do cafeeiro, Kaldi provou os frutinhos avermelhados, comprovando seu poder excitante. Isso teria ocorrido no ano 850. Outras fontes, entretanto, contam ter sido um monge árabe o primeiro a preparar uma infusão com sementes de café, a fim de livrar-se do sono que o impedia de realizar suas orações noturnas.
Em Meca, cidade santa dos muçulmanos, no início do século XVI o café era muito consumido, mas não tardou a ser condenado pelas seitas mais ortodoxas do islamismo e, a pretexto de contrariar o Alcorão, seu uso foi proibido. Em 1526 a proibição foi abolida e tanto a agricultura como o comércio do café desenvolveram-se em toda a península arábica, até chegar à Turquia e depois à Europa, no decorrer dos séculos XVI e XVII.
Quem primeiro divulgou as propriedades do café na Europa foi Leonard Rauwolf, alemão que viajou pelo Oriente em 1592, seguindo-se a ele o botânico italiano Prospero Alpini. Admite-se que em Veneza, no fim do século XVI, consumia-se café. A planta parece ter sido levada para o continente americano, em 1607, pelo capitão John Smith, fundador da Virgínia. No princípio do século XVII, os navios da Companhia das Índias Orientais traziam grandes cargas de café do Oriente.
Foi em Constantinopla (hoje Istambul, Turquia) que se abriu o primeiro estabelecimento para servir café ao público, em 1550. Na Europa as primeiras casas de café surgiram em Veneza, em 1591; Londres, em 1652; e Marselha em 1671. A partir de 1670, estabelecimentos semelhantes difundiram-se pelas grandes cidades dos Estados Unidos.
Com a popularização do uso do café seu cultivo espalhou-se pelo mundo. Conta-se que sua chegada ao Novo Mundo deve-se ao capitão francês Gabriel-Mathieu de Clieu, responsável pela introdução da primeira planta, na Martinica. Entre 1720 e 1723, De Clieu, que servia na guarnição da Martinica, visitou a França, onde soube que os holandeses haviam transplantado com êxito o café para as Índias Orientais, cujo clima se assemelha ao da Martinica. Resolveu então iniciar a cultura nessa colônia; mas os poucos cafeeiros então existentes em Paris eram conservados com muito cuidado, em estufas, pelos jardineiros de Luís XV. Só a muito custo ele conseguiu algumas mudas e durante a viagem de volta à Martinica foi obrigado, durante mais de um mês, a dividir a sua cota de água no navio com os cafeeiros, finalmente plantados na ilha e tratados com cuidado até a produção das primeiras bagas. Elas originaram a maior parte das atuais plantações daquela região.
Distribuição geográfica. O cafeeiro prospera em climas tropicais e em terras de média altitude. O solo deve ser úmido, rico em matéria orgânica e poroso, para evitar a acumulação de água, que apodrece a raiz da planta.
Até a primeira metade do século XX, era generalizada a crença entre os lavradores brasileiros de que o café só podia ser cultivado eficientemente em terras virgens, após a derrubada das matas, limpeza do terreno e abertura das covas para receber diretamente as sementes ou mudas, sem necessidade de adubação devido à fertilidade do solo. Essa crença está superada e o café é hoje produzido dentro das mais modernas técnicas de plantio, de correção do solo e de irrigação e drenagem.
O habitat natural das espécies de maior importância econômica é a zona tropical da África, numa faixa que se estende desde a Guiné até a Etiópia e, ao sul, até Angola. Na Etiópia ainda subsistem florestas de cafeeiros nativos e em algumas regiões da Ásia (Myanmar, Indonésia) certas espécies vegetam espontaneamente.
Existem culturas comerciais em cerca de setenta regiões, do equador aos trópicos, faixa ultrapassada, ao sul, apenas no Brasil e em Moçambique e ao norte em Formosa. As principais espécies estão distribuídas geograficamente como se segue:
Coffea arabica. Predomina no Ocidente, onde 27 países a cultivam isoladamente e 31 associam-na a outras espécies. No continente africano floresce nos planaltos da Etiópia, sudeste do Sudão, Camarão, Angola, região oriental do Zaire, Ruanda, Burundi, Quênia e Tanzânia. Na Ásia quase se extinguiu quando os cafeeiros foram atacados pela ferrugem, uma doença que dá nas folhas do arbusto, mas subsiste em certas regiões das Filipinas e da Indonésia. No Brasil as variedades mais cultivadas são: typica, mundo novo, caturra, maragogipe e bourbon.
Coffea robusta ou canephora. Concentra-se na Ásia e África, predominando no Benin, Togo, Gabão, Congo, Angola, Madagascar, Uganda, Costa do Marfim, Camarão, Libéria, Tanzânia, Guiné, Indonésia, Vietnam, Filipinas, Sri Lanka, Nova Caledônia, Ilhas Comores, além de Trinidad e Martinica. Essa variedade também é cultivada nas Antilhas, Equador e Brasil.
Coffea liberica. De importância econômica reduzida no quadro mundial, é a única espécie existente na Guiana. Seu cultivo se estende a cerca de 17 países, sendo os maiores produtores Suriname, Malásia, Libéria, Filipinas, Guiné Equatorial e São Tomé.
Condições de cultivo. Como planta tropical, o café não se adapta ao clima frio e à seca. As regiões mais favoráveis são as que apresentam temperaturas médias anuais entre 18 e 20o C e em que as mínimas absolutas raramente descem abaixo de zero. As geadas freqüentemente são prejudiciais. Como planta de clima úmido aceita índices pluviométricos da ordem de 1.500mm anuais e as estiagens não podem ser muito longas, já que a seca prejudica mais as lavouras que a umidade excessiva. Quando plantado em condições de solo apropriadas, o cafeeiro começa a produzir no terceiro ano em quantidade apreciável. Seu período de rendimento pleno tem início entre o sétimo e o oitavo ano e sua vida útil situa-se entre 15 e 20 anos. Em algumas regiões do Brasil os cafezais produzem acima dessa idade, por outros vinte anos, aproximadamente.
Os cafeeiros são cultivados atualmente com novos métodos; as mudas crescem em viveiros e são depois transplantadas em fileiras, o que vai facilitar a colheita, além de que a abertura de valas ajuda a controlar a erosão. A qualidade da terra, a seleção de fertilizantes, a irrigação artificial, assim como a proteção contra as geadas e a ferrugem, são fatores de crescente importância na moderna cafeicultura.
A colheita do café é feita de três maneiras: (1) derriça, quando os frutos são arrancados à mão e jogados ao chão, para, em seguida, com auxílio do rastelo (um instrumento agrícola com dentes de madeira ou ferro) serem juntados e peneirados, de modo a se expurgarem as folhas, torrões de terra e outras impurezas; (2) colheita no pano, quando o apanhador de café desprende os frutos do galho e os apara com um pano, normalmente preso à cintura; (3) a dedo, quando se colhem os frutos maduros (cor de cereja), guardando-os em cestos, sacos ou peneiras. É um processo de colheita mais lento, mas melhor apurado.
Os grãos depois de colhidos devem ser limpos e esse trabalho pode ser a seco, com o uso de máquinas especiais, ou por processo hidráulico, em lavadouros. Os processos de secagem dos grãos variam, mas no Brasil, Costa do Marfim e Angola é comum a colocação dos grãos ao sol, em terreiros previamente limpos, onde, durante dez ou 12 dias, são remexidos, espalhados e finalmente amontoados. Do terreiro o café é levado para as tulhas (uma espécie de depósito), onde "descansa" por um período aproximado de quarenta dias, para depois ser beneficiado, classificado e ensacado. Atualmente, na maioria dos grandes centros produtores, entre os quais destacam-se no Brasil os estados de São Paulo, Minas Gerais e Paraná, as diversas etapas do beneficiamento, como secagem, seleção, despolpamento e torrefação, são realizadas mecanicamente.
Economia cafeeira. O comércio mundial do café movimenta bilhões de dólares e mais de vinte milhões de pessoas dependem, em quarenta países, da economia cafeeira como meio de subsistência. Mas nos últimos anos, enquanto a produção vem crescendo na proporção de cinco por cento ao ano, o consumo somente aumenta em 2,5% ao ano. O declínio dos preços do café, decorrente de tal situação, representa um sério obstáculo ao desenvolvimento de alguns países latino-americanos e africanos, cujas exportações de café representam parte substancial de suas receitas em dólar.
Uma característica da economia do café tem sido, ao longo de sua história, o fenômeno dos ciclos de prosperidade e declínio. Enquanto a produção se concentra nos países tropicais, os grandes mercados consumidores localizam-se na Europa e América do Norte. A instabilidade do mercado do café, ocasionada pelas variações do consumo e por condições climáticas (as geadas, por exemplo), torna frágil e dependente a economia dos países que se dedicam à monocultura cafeeira. Essa instabilidade favorece a especulação comercial, sobretudo nos períodos de crise econômica internacional.
O consumo do café disseminou-se em meados do século XIX e está ligado à elevação do padrão de vida da população dos países industrializados. Não sendo o café um produto essencial, seu consumo sofre redução nos períodos de instabilidade econômica ou de crise. Um exemplo disso ocorreu de 1929 a 1939, quando a depressão econômica provocou drástica diminuição de consumo nos Estados Unidos e na Europa. Na época, o prejuízo causado aos produtores e comerciantes de café no Brasil foi tão grande que o governo precisou intervir e criar instrumentos de apoio, numa tentativa de amenizar a situação. Após a segunda guerra mundial os Estados Unidos aumentaram consideravelmente o consumo e a importação do produto, tornando-se responsáveis pela compra de mais de 65% de todo o café produzido no mundo. Esse quadro foi novamente se modificando com o correr dos anos e, na década de 1980, a participação dos Estados Unidos no mercado de café não ultrapassava a casa dos trinta por cento. Os maiores importadores, além dos Estados Unidos, localizavam-se na Europa ocidental: Alemanha, França, Itália, Países Baixos e Espanha. Também o Japão e alguns países árabes se tornaram grandes importadores.
Café solúvel. O mercado internacional de café vem, desde a década de 1960, sofrendo a intervenção de um novo fator: o café solúvel. Nos países mais desenvolvidos, como Estados Unidos, Japão e alguns da Europa, o solúvel já substitui o tradicional café de coador. Um dos problemas técnicos em relação ao café solúvel é que para a sua fabricação é necessário utilizar um processo (spray) que provoca a perda do aroma do produto final. Algumas indústrias já estão utilizando o processo de liofilização, que permite a transformação da matéria-prima com menor perda da qualidade ou do aroma tão característico, principalmente nos grãos arábicos, os de maior aceitação em todo o mundo.
A participação do café solúvel no mercado brasileiro ainda é pequena, em vista do hábito do café de coador, que preserva o aroma. O Brasil possui algumas fábricas de café solúvel, área em que os Estados Unidos vêm se expandindo, com a montagem de empresas em seu próprio país, na América Central e na África. Algumas empresas brasileiras são associadas a grupos americanos e a produção e exportação de solúvel é estimulada pelo governo. Desde o final da década de 1970 abriu-se para o café um novo e promissor mercado, representado pela China e os países da antiga União Soviética.
As oscilações nos preços internacionais do café levaram os países produtores a desenvolver uma política de entendimento, através de acordos internacionais e conferências, nem sempre bem-sucedida. A Conferência Pan-Americana do Café, reunida em 1958, no Rio de Janeiro, criou a Organização Internacional do Café (OIC), com a participação de países exportadores e consumidores. Entretanto, suas reuniões nunca foram pacíficas, devido ao choque de interesses. Os acordos tentam minorar a tendência de desequilíbrio entre produção e consumo. Inicialmente conseguiu-se algum êxito mas nos últimos anos da década de 1980 e no início da década de 1990 registrou-se uma baixa acentuada nos preços dos países produtores.
Café no Brasil
A expansão do café teve importantes consequências no Brasil: inicialmente fez surgir uma nova paisagem em áreas outrora cobertas de matas; deu nascimento, ao tempo do Império, a uma nova aristocracia rural, os chamados "barões do café", tão opulenta quanto a dos "senhores de engenho", do Nordeste açucareiro, constituída por ricos fazendeiros do Vale do Paraíba, da região de Campinas e do sudeste de Minas Gerais; o povoamento de vastas regiões e o aparecimento de cidades pioneiras; a introdução do imigrante italiano no estado de São Paulo; a multiplicação das vias férreas e o aparelhamento do porto de Santos; e finalmente, o deslocamento da economia brasileira para o Sudeste.
Ao findar o século XIX o café era o principal produto brasileiro de exportação. Nem a abolição da escravatura viria abalar a situação. A história econômica do Brasil passou a girar em torno do "ouro verde". Com a proclamação da república os paulistas enriquecidos, donos da economia nacional, passaram a substituir os políticos baianos e fluminenses na condução dos negócios do país. A produção cresceu em demasia e a superprodução gerou as primeiras crises. A situação agravou-se consideravelmente com o crash da Bolsa de Valores de Nova York, em outubro de 1929, que trouxe consigo a queda dos preços do café.
Nos anos seguintes houve recuperações parciais. Os produtores internacionais têm recorrido ao expediente de acordos e conferências para tentar regular o mercado mundial. No início da década de 1990 o Brasil ainda era o principal produtor mundial mas a insistência na produção levou a uma política perigosa de quantidade em detrimento da qualidade. O Brasil passou de principal produtor a condição de grande produtor. Com tudo isso, o ciclo de uma de suas principais fontes de riquezas ainda está longe de ter terminado.
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