Agricultura Orgânica: Conceitos e Caracterização
Caracterização
A Agricultura Orgânica tem apresentado um crescimento expressivo em âmbito mundial, principalmente em área plantada e oferta de produtos. A área certificada com produção orgânica nos países da União Europeia cresceu quase 900% em 10 anos, ou seja, se elevou de pouco mais de 100.000 ha em 1985, para quase 5.000.000 ha em 2015.
Segundo Darolt (2002), entre 1998/99 existiam aproximadamente 80 mil propriedades orgânicas nos principais países da União Europeia, cobrindo uma área em torno de dois milhões de hectares. Reconhece-se que estes valores ainda têm pouca expressão, representando apenas 1,1 % do total de propriedades existentes e, aproximadamente, 1,4 % da área agrícola cultivada. Mas, alguns países já apresentam percentuais muito superiores à média europeia.
Segundo estas estatísticas, a Itália é o primeiro país da União Europeia tanto em termos de área total cultivada (564.913 ha) como em número de produtores (29.390). Nela, os produtos orgânicos já representam 5% da área e movimentam 8% do mercado de alimentos.
A Áustria é o país da União Europeia com o maior percentual de agricultores orgânicos (8%) e também possui a maior área orgânica proporcionalmente cultivada (10,1%). Este crescimento pode ser verificado também na França, que apresentou um aumento significativo de algumas produções animais na linha orgânica, sobretudo o frango orgânico que teve taxas de crescimento de 135% nos últimos dois anos. A Suíça é outro país que apresenta cifras acima da média em agricultura orgânica, cerca de 6,7 % da área total é cultivada com agricultura orgânica e 5,5% dos agricultores são orgânicos.
Na América do Sul, a Argentina é, atualmente, o país com a maior área certificada. A área sob certificação em 1992 era de 5.500 ha e em 1997 era de 287.000 hectares. Os últimos dados mostram que no ano 2000 está área chegou a cerca de 380.000 hectares. Deste total, 28% eram destinados à produção vegetal e 72 % à produção animal.
Em relação ao mercado, em 1996, o mercado de alimentos diferenciados da União Europeia chegou a compor cerca de 7% do total, atingindo cerca de U$ 2,8 bilhões. Atualmente, calcula-se que o volume comercializado de produtos orgânicos na União Europeia esteja entre U$ 4,0 e 5,0 bilhões, e países como Estados Unidos, Canadá e Japão apresentam também valores similares. Verifica-se que o crescimento do mercado de produtos orgânicos apresenta um taxa média de 10% ao ano no Brasil, 20% ao ano nos Estados Unidos e 25% ao ano na Europa. Entretanto, existem regiões e produtos específicos em que estas taxas têm sido muito maiores.
O Brasil ocupa atualmente o trigésimo quarto lugar no ranking dos países exportadores de produtos orgânicos. Nos últimos anos o crescimento das vendas chegou a 50% ao ano. Estima-se que já estão sendo cultivados perto de 100 mil hectares em cerca de 4.500 unidades de produção orgânica. Aproximadamente 70% da produção brasileira encontram-se nos estados do Paraná, São Paulo, Rio Grande do Sul, Minas Gerais e Espírito Santo.
Segundo Darolt (2002), o sucesso no desenvolvimento do sistema orgânico nos vários países que se destacam na produção orgânica deve-se: ao incentivo financeiro aos produtores (a maior razão de crescimento do número de agricultores é o incentivo governamental); à eficiência na informação aos produtores e consumidores; ao acesso e à disponibilidade de produtos orgânicos; à questão de marketing (logomarca) e proteção legal; e à implementação de um plano de desenvolvimento para agricultura orgânica.
No Estado do Espírito Santo, cerca de 80,2% dos estabelecimentos rurais possuem até 50 ha, totalizando 58.707 estabelecimentos rurais com este perfil fundiário. Existem cerca de 23.492 estabelecimentos que possuem área de até 10 ha, correspondendo a 32,1% dos estabelecimentos rurais (SOARES, 1998). Os agricultores familiares enfrentam obstáculos consideráveis para sua inclusão no desenvolvimento econômico social do Estado. Políticas públicas inadequadas, intempéries climáticas, degradação da base natural dos recursos das unidades produtivas, pequena diversificação das atividades agrícolas, estreitamento da base alimentar, baixa produtividade e falta de competitividade no mercado são os principais entraves identificados.
Em decorrência disso, tem se verificado o empobrecimento, a migração, sobretudo da população jovem e das mulheres, e uma série de problemas sociais decorrentes, colocando também em risco a segurança alimentar tanto no campo quanto nas cidades.
A agricultura orgânica e a agricultura familiar encontram-se estreitamente articuladas, sobretudo dentro de uma perspectiva ética. A agricultura orgânica tem sido apontada e apoiada em diferentes instâncias como uma estratégia capaz de permitir a reprodução destas unidades produtivas, com a inclusão social e econômica dos agricultores familiares (SCHMIDT, 2001; GUELBER SALES, 2002a), a construção de uma nova percepção ambiental e até mesmo de contribuir para taxa positivas de crescimento demográfico (SALES, 2002). Por sua vez, a agricultura familiar teria maiores chances de sucesso na aplicação dos princípios da agroecologia nas unidades produtivas, devido a sua maior identificação com a terra e com os recursos naturais, à sua maior facilidade histórica para diversificação das atividades e o seu pouco envolvimento com a modernização da agricultura (CAMPANHOLA, 1999; CARMO, 1998). Assim, a agricultura familiar viabiliza a agricultura orgânica, dentro de sua dimensão ética e a agricultura familiar se viabiliza através da agricultura orgânica (SCHMIDT, 2001).
Desta forma, as organizações estaduais capixabas que apoiam a agricultura familiar veem a produção orgânica como um importante instrumento para a inclusão social dos agricultores familiares num plano de desenvolvimento regional sustentável e solidário. Historicamente, a produção nacional de alimentos tem sido feita, em sua grande parte, em sistemas de agricultura familiar e no Espírito Santo essa característica também prevalece.
Assim, à medida que a sociedade estabelece uma relação direta entre saúde e qualidade da alimentação e cresce a demanda de produtos orgânicos, é importante que sua produção passe a ser realizada cada vez mais pelos agricultores familiares. Segundo DAROLT (2002) essa tendência tem se verificado, pois 90% dos agricultores orgânicos no país correspondem a pequenos produtores familiares ligados a associações e grupos de movimentos sociais, que respondem por 70% da produção orgânica brasileira. Essa tendência se verifica, contudo, mais na região Sul. No Sudeste, a adesão é prioritariamente de grandes propriedades.
Apesar do crescimento experimentado pela agricultura orgânica nos últimos anos, as informações estaduais apontando o nível de adesão dos agricultores familiares à proposta agroecológica são bastante superficiais e incompletas. Além disso, existe a incerteza se a proteção (ou obrigatoriedade) de um dispositivo institucional – certificação da produção orgânica exigida pela IN 007/99 (BRASIL, 1999) - contribuirá para a inserção dos agricultores familiares no mercado orgânico ou será uma outra forma de exclusão (BYÉ & SCHMIDT, 2001). A dúvida reside nas dificuldades de ordem financeira e técnica que os agricultores familiares encontram para a conversão de seu processo produtivo para a agricultura orgânica, tendo em conta o desconhecimento do mercado, a apropriação de normas, princípios e técnicas, e os custos de implantação e de certificação da produção orgânica. Em nosso Estado, a certificação participativa tem sido vislumbrada como um instrumento importante para que as unidades de base familiar possam se inserir mais facilmente no processo de produção orgânica.
Até o momento, o levantamento de informações sobre o estado da arte da agricultura orgânica capixaba tem ficado restrito a dados declarados pelas Certificadoras que atuam no Estado e a impressões de visitas e diálogos com agricultores. Referências mais concretas, apenas as colhidas nos grupos diretamente atendidos por algumas entidades estaduais e pelos técnicos do Incaper que desenvolvem ações de pesquisa, assistência técnica e extensão em agricultura orgânica. Essas informações têm se mostrado insuficientes, tanto no aspecto quantitativo quanto qualitativo, mas, ainda assim, têm possibilitado situar a agricultura orgânica formal (propriedades consideradas em processo de conversão ou certificadas oficialmente) quanto à sua abrangência, principais produtos e área cultivada. Dados de outubro de 2002 sobre a produção orgânica formal (propriedades que já iniciaram o processo de conversão inspecionado por uma das certificadoras IBD, AAO e CHÃO VIVO e aquelas que já estão de posse do selo orgânico), revelaram a existência de 72 unidades certificadas e em conversão e de uma área de 6.234 hectares cultivados em sistema orgânico, em 19 municípios capixabas (GUELBER SALES, 2002b).
Atualmente, 210 unidades produtivas estão certificadas como orgânicas, mas o número de unidades em processo de certificação é bastante superior e crescente. Somente na Associação CHÃO VIVO, existem 248 agricultores inscritos. A agricultura orgânica já está presente em mais de 30 municípios capixabas. Devemos ressaltar que esses números são dinâmicos, pois a cada dia novos agricultores obtêm a certificação de suas unidades produtivas, uns se iniciam no processo de certificação e outros experimentam práticas agroecológicas em suas unidades.
Os levantamentos realizados não nos permitem conhecer a produção orgânica informal desenvolvida no anonimato dos grupos de mulheres, associações de agricultores e trabalhos de comunidades em todo o Estado, que ainda não recorreu aos mecanismos de reconhecimento institucional via Certificadoras. Estima-se que pelo menos mil famílias estejam envolvidas com a proposta da agricultura agroecológica no Estado.
A necessidade de pesquisa em agricultura orgânica tem sido apontada pelos diversos setores envolvidos na cadeia produtiva dos produtos orgânicos, que colocam a necessidade de apoio à pesquisa e à geração tecnológica entre as condições fundamentais para o desenvolvimento da agricultura orgânica. O grande déficit tecnológico para o setor deve-se ao fato de que, nas últimas décadas, as empresas oficiais de pesquisa e universidades praticamente não investiram nesta atividade.
Segundo Darolt (2002), o crescimento da agricultura orgânica é nitidamente superior em países como Suíça, Alemanha e Estados Unidos, onde existem institutos de pesquisa em agricultura orgânica, responsáveis pela pesquisa, extensão e acompanhamento do sistema.
Além disso, a produção orgânica no Estado se desenvolve em situações às vezes desfavoráveis relacionadas à má conservação do solo, recursos hidricos e florestais, consequentes do modelo anterior, e à adoção de práticas de agricultura orgânica como a adubação orgânica e de melhoria da biodiversidade ainda são pouco empregadas. Este último aspecto bastante agravado em lavouras convencionais de café em transição para a agroecologia, que foram implantadas seguindo recomendações de superadensamento.
Existe uma tendência por parte daqueles que se iniciam na atividade, de substituir insumos "proibidos" por "permitidos", conservando uma atitude produtivista e sem a incorporação dos princípios da agricultura orgânica. Isto tem resultado em uma elevação acentuada dos custos de produção. Com isso, fatores ligados a baixa produtividade, pragas e doenças, degradação ambiental, podem também torná-la insustentável ecológica e economicamente.
Observa-se também que os produtos produzidos como "orgânicos" muitas vezes não apresentam as características e a qualidade exigidas para assim denominá-los. Sendo assim, estes processos de produção dificilmente receberiam a certificação como orgânicos.
Esta realidade se reproduz, sobretudo pela desinformação dos agricultores sobre como conduzir o processo de produção orgânica, coerente com as normas instituídas e de forma sustentável, e impede que um maior número de agricultores se dedique a esta atividade.
Embora observemos ainda uma certa “simplificação” nos sistemas de produção da maioria dessas propriedades com o emprego insuficiente de práticas de AO, foram observadas entre outras a compostagem, a aplicação de urina, a adubação verde, uso de biofertilizantes, consórcios de culturas e uma busca pelo aumento da biodiversidade.
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