ALELOPATIA: A DEFESA NATURAL DAS PLANTAS

Alelopatia: A defesa natural das plantas

A noção de que as plantas têm a capacidade de interferir no desenvolvimento de outras, por meio de substâncias que liberam na atmosfera ou no solo, remonta à Antigüidade. Já no século III a.C., o grego Teofrasto, autor de um tratado sobre botânica, conhecido pela versão latina "De Plantis", recomenda que não se cultive a couve junto da videira, pois os "odores" da primeira prejudicam o desenvolvimento da segunda.

Mais tarde, no século I a.C., o poeta romano Virgílio refere-se ao efeito da queima que o linho e a papoula dormideira provocam nas culturas instaladas em seguida no mesmo terreno. Outros autores, na antiga Roma, também avisam aos agricultores que não tentem renovar as vinhas envelhecidas no mesmo terreno, pois elas o deixam "morto" ou "entorpecido", como se tivesse sido envenenado.

O conceito de "antipatia" entre as plantas é mencionado em vários escritos da Renascença. Os autores da época afirmam, por exemplo, que não se deve cultivar o nabo perto do loureiro, que a nogueira e o carvalho prejudicam as culturas feitas sob suas copas ou nas proximidades, que o pepino cresce mal junto da oliveira e que a cana e a samambaia não gostam uma da outra.

A incompatibilidade percebida entre algumas espécies é provocada pela liberação de substâncias voláteis ou por exalação radicular de toxinas. O girassol é "antipático" à soja por exalar pelas raízes compostos fenólicos inibidores do crescimento da soja. A "doença da terra" que ocorre nas monoculturas decorre, entre outras causas, do acúmulo no solo de substâncias alelopáticas.

Alelopatia
O termo "alelopatia" foi criado em 1937, pelo pesquisador alemão Hans Molisch, com a reunião das palavras gregas "allélon" e "pathos", que significam respectivamente, mútuo e prejuízo. Segundo Molisch, alelopatia é "a capacidade de as plantas, superiores ou inferiores, produzirem substâncias químicas que, liberadas no ambiente de outras, influenciam de forma favorável ou desfavorável o seu desenvolvimento". O conceito engloba atualmente o reino animal, com o reconhecimento de que a alelopatia se processa entre eles e entre plantas e animais.

As interferências alelopáticas raramente são provocadas por uma única substância. A forma de atuação dos compostos alelopáticos também não é específica. As funções prejudicadas com maior freqüência são a assimilação de nutrientes, o crescimento, a fotossíntese, a respiração, a síntese de proteínas, a permeabilidade da membrana celular e a atividade enzimática.

Presentes em todos os seres vivos, as substâncias alelopáticas são encontradas em maior quantidade e diversidade nas plantas. Distribuem-se por todos os seus órgãos de maneira não-uniforme, mas geralmente a concentração é maior na epiderme das folhas e nas raízes.

Na natureza, a alelopatia confunde-se com outras interferências existentes entre as plantas, como a competição e, por isso, alguns autores colocam sua existência em dúvida. Os dois conceitos, porém, são bastante distintos: enquanto a competição se dá pela retirada ou redução de fatores do meio ambiente, como água, nutrientes e luz, a alelopatia se caracteriza pela introdução de novos fatores - os compostos químicos - no ambiente.

Função protetora
A função principal das substâncias alelopáticas é a proteção dos organismos que as produzem. A condição natural dos seres vivos é a de serem saudáveis, o que é propiciado, em grande parte, pela presença de produtos secundários que os defendem dos inimigos. A identificação dessas substâncias, em diversas culturas, auxilia os especialistas em melhoramento genético na criação de genótipos mais resistentes a bactérias, fungos e insetos.

O emprego prático da alelopatia pode não levar ao controle total das espécies prejudiciais, sejam elas fungos, insetos ou ervas. A ação dos produtos secundários é essencialmente inibidora, reduzindo populações ou afetando o desenvolvimento e o vigor dos organismos atingidos.

No entanto, se esta inibição ajudar a manter o equilíbrio biológico das espécies, sem causar dano às culturas ou ao meio ambiente, estará sendo atingido o almejado objetivo ecológico.

Plantas Companheiras
São plantas pertencentes a espécies ou famílias, que se ajudam e complementam mutuamente, não apenas na ocupação do espaço e utilização de água, luz e nutrientes, mas também por meio de interações bioquímicas chamadas de Efeitos Alelopáticos. Estes podem ser tanto de natureza estimuladora quanto inibidora, não somente entre plantas, mas também em relação a insetos e outros animais.

Seguem alguns exemplos :
As plantas da família das solanáceas ( tomate, batata, pimentão, entre outras) e as da família das compostas (Cichoriaceae), como alfaces e chicórias combinam bem entre si. Estas famílias, por sua vez, também combinam com umbelíferas (Apiaceae) como cenoura, salsa, aipo, erva-doce, batata-salsa e com Liliáceas como o alho e a cebola.

As cuburbitáceas (abóbora, pepino, melão, melancia, chuchu) associam-se bem com as solanáceas, com plantas leguminosas(feijão, ervilha) e gramíneas(milho, trigo), conforme seu hábito de crescimento e forma de cultivo; alternado-se fileiras -duplas tutoradas, por exemplo, de tomate, feijão-vagem e pepino, ou na tradicional associação de milho, feijão e abóbora.

Alelopatia Aplicada
Em relação aos insetos prejudiciais, algumas plantas têm ação repelente ou atrativa. Ambos efeitos podem ser utilizados nos exemplos a seguir:

Plantas Antagônicas
Algumas espécies possuem substâncias que afastam ou inibem a ação de insetos, como ocorre, por exemplo, com o piretro, presente no cravo-de-defunto e nos crisântemos. Como qualquer estratégia de manejo agroecológico, o uso de tais plantas não deve ser feito isoladamente e, sim, dentro de uma visão abrangente de promoção do equilibro ecológico em toda a propriedade agrícola. Quanto mais equilibrados estiverem o solo, as plantas e os animais, menor será a necessidade de se apelar para tais estratégias, aproximando a produção orgânica da situação ideal que é a de pouco intervir porque agroecossistema já se tornou capaz de se auto-regular.

a) Cravo-de-defunto (Tagetes minuta) e ou Cravorana (Tagetes sp) silvestre.
As plantas inteiras, principalmente no florescimento, são boas repelentes de insetos e nematóides (no solo). Usadas em bordadura das culturas ou em pulverizações na forma de extratos alcoólicos, atuam tanto por ação direta contra as pragas, quanto por "disfarce" das culturas pelo seu forte odor.

Fórmula Geral: 200 gramas de planta verde, mascerados por 12 (doze) horas em álcool (aproximadamento 1 litro) e diluídos em 18 a 19 litros de água (20 litros para pulverização)

b) Cinamomo (Melia azedorach L., família Meliaceae)
O chá das folhas e o extraído acetônico-alcoólico dos frutos (ambos na dosagem média de 200 gramas para um volume final de 20 litros para pulverização) são inseticidas. Os frutos devem ser moídos e seu pó pode ser usado na conservação de grãos armazenados.

Observação: É uma árvore ornamental comum no sul do Brasil, de origem asiática.

c) Saboneteira ( Sapindus saponaria L.)

Árvore nativa da América Tropical, usada como ornamental , possui nos frutos um efeito inseticida. Para se ter uma idéia de seu poder de ação, vale mencionar que seis frutos bastam para preservar 60 quilos de grãos armazenados.

Os estratos podem ser feitos dos frutos amassados diretamente em água (uso imediato) ou conservados por extração acetônica e/ou alcoólica. Em ambos os casos, 200 gramas são suficientes para o volume de 20 litros de um pulverizador costal.

d) Quássia ou Pau-amargo (Quassia amara, família Simarubaceae)

Arbusto alto, nativo da América Central, com ação inseticida especialmente contra moscas e mosquitos, pelo alto teor de substâncias amargas na casca e madeira. Estas partes podem ser usadas em pó ou extrato acetônico-alcoólico, assim como os ramos e folhas, variando apenas a concentração: 200 gramas de cascas ou madeira moída.

e) Mucuna-preta (Mucuna sp ou Stizolobium oterrium)

Plantada associada ao milho, evita mais de 90% da instalação dos gorgulhos nas espigas
Atrativos ou "Plantas-Armadilhas"

Muitas plantas possuem substâncias atrativas específicas para alguns insetos, que podem ser utilizadas como plantas-armadilha para várias pragas. A simples concentração dessas pragas já as torna mais vulneráveis a parasitas e predadores, assim como mais sujeitas a doenças, permitindo também a utilização de métodos agroecológicos de manejo de pragas e doenças.

Seguem alguns exemplos de plantas atrativas de comprovada utilidade na horticultura:
Purungo ou Cabaça (Lagenaria vulgaris)

Plantado em bordadura (em forma de cercas-vivas) ou com seus frutos cortados e espalhados na lavoura é o melhor atrativo para o besourinho ou vaquinha verde-amarela (Diabrotica speciosa).
Tajujá (Cayaponia tayuya)

Planta da família das cucurbitáceas, atrativa para as vaquinhas. Sua limitação consiste no fato de que as raízes que são a parte mais útil da planta, são de cultivo mais difícil que o do Purungo.

As plantas competem entre si?
As incompatibilidades e os favorecimentos entre nossas plantas.

Muitas vezes já escutamos jardineiros, ou outras pessoas acostumadas a lidar com a terra, dizerem que uma certa planta “não vai para frente” quando é plantada junto com outra. A planta não cresce bem, ou morre sempre que a outra existe na vizinhança. É como se uma competisse com a outra. Por exemplo, existem agricultores que recomendam não se plantar abóbora com batatas, nem alho com ervilhas e feijão. Por outro lado, dizem que o alho favorece as roseiras, protegendo-as contra pragas e melhorando seu aroma. Já a cenoura vai bem quando associada à ervilha, alface, tomate, rabanete...

O que diz a ciência sobre esses fenômenos observados?
De fato, os cientistas têm observado uma interferência causada por algumas plantas sobre o desenvolvimento de outras. Um grupo de pesquisadores da Esalq (Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz), Universidade de São Paulo, demonstrou que a erva daninha Cyperus rotundus, a conhecida tiririca, reduz drasticamente a produção e o peso dos frutos da abobrinha Cucurbita moschata.

Desde a ápoca de Plínio (23-79 d.C.), é conhecido o efeito de algumas espécies de nogueira (Juglans spp.), inclusive a espécie produtora das conhecidas nozes, sobre outras plantas que crescem próximas. Segundo os relatos, seus efeitos adversos atingem pinheiros, macieiras, batatas e cereais.

Em 1925, pela primeira vez a ciência começou a explicar as causas do fenômeno, quando A.B. Massey observou que morriam todos os tomatinhos plantados a uma distância de até 16 metros do tronco da nogueira, enquanto os pezinhos de tomate plantados além dessa distância se desenvolviam bem.

Como essa distância coincidia com a extensão das raízes da nogueira, ele supôs que as raízes liberassem no solo uma substância tóxica para outras plantas. Depois descobriu-se que a área da copa da árvore também influía no fenômeno e demonstrou-se que as folhas da nogueira produziam uma substância que era extraída pela umidade e, ao penetrar no solo, sofria hidrólise e oxidação, transformando-se em uma naftoquinona, toxina que recebeu o nome juglona.

A substância produzida era inofensiva para a própria nogueira, porém, uma vez no solo, passava a ser extremamente tóxica para outras plantas, levando-as à morte e, inclusive, inibindo a germinação de sementes.

A alelopatia teve grande desenvolvimento nos EUA, durante os anos 1939-1945, época da segunda guerra mundial, quando muitos fisiologistas, trabalhando em projetos bélicos, fizeram um grande número de descobertas acidentais sobre interações alelopáticas, nas plantas do deserto da Califórnia. Uma dessas plantas, pesquisada como uma possível nova fonte de borracha, fornece um bom exemplo de como a alelopatia pode ser um fator limitante para a própria espécie da planta: Parthenium argentatum, da família das Compositae, conhecido como “guayule”, ou planta da borracha. Observou-se que os pés de guayule que ficavam na borda da plantação sempre cresciam melhor do que os pés que ficavam no meio, e o fenômeno não se devia a competição por água ou sais minerais, pois rega extra ou aplicação extra de minerais não eliminava o problema. A causa era uma toxina exsudada pelas raízes do guayule, que causava auto-inibição e parecia não afetar outras plantas. As mudinhas que não conseguiam se desenvolver sob plantas grandes de Parthenium, se desenvolviam muito bem sob a copa de outros arbustos. Foi identificado o ácido cinâmico como sendo a toxina responsável pelo efeito, presente no exsudato das raízes. O ácido cinâmico é cem vezes mais tóxico para o próprio guayule do que para outras espécies de plantas, como o tomate, por exemplo. O resultado prático desse conhecimento é que, para garantir uma boa produção de borracha, o guayule deve ser plantado com um espaçamento mínimo entre as mudas, de modo a não acontecer a auto-inibição. Talvez no ambiente nativo da planta, a toxina produzida sirva para inibir o crescimento de competidores de outras espécies.

Alelopatia
Alguns organismos, principalmente vegetais, que não conseguem deslocar-se para evitar a competição defendem-se produzindo, e liberando no solo, substâncias químicas tóxicas a seus potenciais competidores, chamados agentes alelopáticos. Com isso, garantem uma área de terreno em torno de si livre de competidores e com recursos (água, nutrientes, iluminação) suficiente para sua sobrevivência. A ação do antibiótico penicilina, produzido por alguns fungos, inibindo o crescimento de bactérias ao seu redor é um exemplo clássico de alelopatia.

A exclusão de competidores pela produção de substâncias tóxicas foi chamada, pelo pesquisador alemão Hans Molisch, de alelopatia. O interesse por esta forma de ação ecológica começou no século passado, quando os agrônomos procuravam explicar a "doença da terra"; pela qual um solo tornava-se improdutivo - mesmo com o emprego de fertilizantes - depois de se plantar nele o mesmo vegetal por vários anos. Descobriu-se, então, que substâncias alelopáticas eram produzidas pelas raízes das plantas e impediam o desenvolvimento de novas culturas.

As substâncias alelopáticas - quimicamente identificadas com terpenos, fenóis, taninos e alcalóides - não são produzidas somente pelas raízes. Também o são pelas folhas e contaminam o solo aonde caem. Tal é o caso do pinheiro, sob cuja copa poucas plantas conseguem crescer.

A alelopatia é um fator responsável pela organização espacial das populações vegetais. O espaçamento natural - extremamente regular, como se houvessem sido plantados - entre arbustos do chaparral (ambiente semelhante à caatinga) californiano é causado pela alelopatia.

Os agrônomos têm intensificado seus estudos sobre a ação das substâncias alelopáticas, com vistas a empregá-las no controle de ervas-daninhas, no lugar de herbicidas altamente tóxicos. Já se tem usado, com sucesso, uma cobertura de mucuna-preta (Stipolobium sp) sobre o solo para evitar a tiririca. A cobertura morta de aveia, combinada com azevém - com sucesso em algumas regiões brasileiras - consegue manter o solo limpo de ervas por algum tempo.
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