Ayahuasca | A Sacralidade da Floresta e a Consciência Ecológica


Ayahuasca | A Sacralidade da Floresta e a Consciência Ecológica

Ayahuasca | A Sacralidade da Floresta e a Consciência EcológicaBuda define a floresta como “um organismo especial de bondade e benevolência infinitas que não faz nenhuma exigência para o seu sustento e espalha generosamente os frutos de sua atividade vital. Ela fornece proteção a todos os seres e oferece sombra até mesmo ao lenhador que a destrói.”

Todos dependem de alguma forma da benevolência das árvores. Além de embelezarem a paisagem elas servem como lar para muitos seres. São elas que ajudam a regular o clima e a conter a erosão que mata o solo. Quimicamente transduzem a energia solar e fixam carbono. São fonte de alimento e remédios. Existem muitas funções para elas. Até mesmo aqueles que estão cegos pela ambição, delas se beneficiam pois são a fonte de matéria-prima para a confecção do papel moeda.

Muitos povos da antiguidade prosperaram devido ao uso da madeira. Seu valor era comparado às vezes como o do ouro. Na Mesopotâmia, durante o reinado de Naramsin (aproximadamente 2254-2218 a.C.), as ordens para saquear as cidades priorizava a busca por madeiras.

A devastação das florestas em várias civilizações alcançou índices tão altos que acarretaram medidas para a preservação deste recurso. Hamurabi (1792-1750 a.C.), assustado com a devastação elaborou a seguinte sentença: “se eu constatar dano feito a um galho sequer [...], não tolerarei que o culpado por esse crime continue vivo”.A pena de morte para quem cortasse uma árvore também existia no direito de países como Roma, França, Itália e Alemanha.

Roma e Egito propulsaram seu desenvolvimento com o uso da madeira. Da mesma forma, quando este recurso tornou-se escasso seus impérios decaíram. Em Roma, grandes áreas florestais deram espaço para ovelhas e agricultura. Mesmo naquela época existiam pessoas capazes de prever os danos causados pelo desmatamento, mas poucos davam-lhes crédito.

Percebe-se uma similaridade dos problemas ambientais antigos com os atuais. A diferença é que hoje a destruição é mais fácil e potente.

Alguns povos antigos estabeleciam um contato sagrado com a floresta. Ela serviu de templo ao ar livre e local de retiro espiritual para sábios. Esta relação também ajudava na preservação destes lugares. Acreditava-se que as matas eram morada dos deuses e por eles protegidas.

Existia a crença de que se certas áreas florestais fossem molestadas recairia sobre os homens a maldição dos deuses, na forma de prejuízo na agricultura ou doenças. É interessante notar o reflexo desta crença nos dias atuais: quando o desmatamento avança muito nas áreas silvestres aparecem novas epidemias e a terra é lixiviada. Mesmo sem possuir o conhecimento científico de hoje, intuitivamente alguns homens sabiam que o uso desordenado dos recursos da natureza não era uma atitude ‘natural’.

Observando a atitude do homem que destruiu muito de suas florestas, como é o caso da Europa que possuía imensas extensões de áreas silvestres, e continua a destruir, conclui-se que ainda persiste no homem um antigo hábito destrutivo.

O que falta então para que sejam tomadas as medidas equilibradoras que garantirão a existência dos recursos naturais para as gerações futuras? Pode-se supor que o conhecimento científico e os recursos financeiros sejam suficientes para trabalhar o desenvolvimento sustentável. Mas os fatos mostram que ainda falta algo. Pois um dos países mais ricos do mundo e que já foi até a lua recusou-se em colocar seu nome no Protocolo de Quioto.

Qual seria o fator capaz de fazer o ser humano preservar a natureza e sua espécie? O que dizer de mais consciência no manejo e uso dos recursos naturais e que o homem conheça mais sua casa através da ecologia e a administre através da economia. Ele deve se desapegar dos antigos paradigmas, pois são estes que dão suporte para as decisões dos homens que detêm o poder e os atos resultantes, em sua maioria, mostram que eles não tratam bem de sua Oikos e dos seres residentes deste mesmo lugar.

Os astronautas que foram à lua tiveram experiências capazes de mudar suas vidas. Não apenas pelo privilégio reservado à poucos de pisar no solo lunar, mas um privilégio maior, enxergar a Terra do espaço. Estes homens, imbuídos de uma missão essencialmente científica puderam dar pequenos passos para além das fronteiras da mente. Trazendo novas idéias para um novo paradigma.

O astronauta James Irwin disse: “a Terra nos recorda uma árvore de Natal dependurada no fundo negro do universo. Quanto mais nos afastamos dela, tanto mais vai diminuindo seu tamanho. Até finalmente ser reduzida a uma pequena bola, a mais bela que se possa imaginar. Aquele objeto vivo tão belo e tão caloroso parece frágil e delicado. Contemplá-lo muda a pessoa, pois ela começa a apreciar a criação de Deus e a descobrir o amor de Deus”. Outro astronauta, Gene Cernan, ao contemplar a Terra sentia-se “[...] interiormente, obrigado a louvar a Deus. Deus deve existir por ter criado aquilo que eu tinha o privilégio de contemplar”.

Um dos objetivos deste trabalho é abordar uma nova consciência que começa a surgir nos seres humanos. Ela vem unindo uma visão holística e espiritual com a ecologia. Pode-se chamá-la consciência ecológica. Como eixo indispensável de discussão, será tratada também sua relação com a engenharia florestal.

Outro tema que objetiva enriquecer a literatura das ciências florestais é a etnobotânica. São poucos os trabalhos científicos que abordam este tema e mais escassos ainda são os que tratam da sacralidade da floresta.

Muitos textos sagrados antigos construíram relações entre o homem e as árvores. Seja em suas simbologias e mitologias ou na relação direta em que certa árvore era considerada como a manifestação de alguma deidade. Em certos casos, imensas florestas eram consagradas à um deus específico. Esta relação entre o homem e a árvore assumia posições em que aquele se confundia com esta. Foi por isto que um dos grandes filósofos, Platão, expressou este pensamento: “o homem é uma planta invertida, cujas raízes se estendem para o Céu e cujos ramos mergulham na Terra”.

A antiga Índia deixou um legado cultural riquíssimo. Num de seus ramos do sistema de Yoga, Hatha Yoga, existe uma posição (ásana) do corpo humano que tenta imitar uma árvore. Esta posição chama-se vriksha-asana. Enquanto o praticante realiza esta posição, ele imagina que seus pés são raízes, as pernas um tronco e os braços e cabeça os galhos de uma árvore.

O registro histórico da relação mágica entre o homem e as florestas pode enriquecer a engenharia florestal. Pois tudo que relaciona-se com as florestas de algum modo está ligado a engenharia florestal.

Neste trabalho encontram-se argumentos que ressaltam o lado ‘poético’ contido na relação do homem com a natureza e a floresta. Sem, contudo, diminuir a importância da ciência pura. Mas tende-se para este lado menos palpável, pois a maioria do enfoque sobre a natureza a encara como um ‘tubo de ensaio’.

Buscando ainda enriquecer a literatura da engenharia florestal, este trabalho tem como objetivo divulgar uma prática religiosa nascida no seio da floresta amazônica. É o uso ritualístico da ayahuasca. Ayahuasca é um chá preparado com duas plantas amazônicas e foi tradicional e culturalmente transmitido pelos ancestrais indígenas até chegar aos grandes centros urbanos. Mas não é só no Brasil que a ayahuasca ganhou espaço e importância. Vários cientistas do exterior, das mais famosas universidades, interessaram-se em estudar este fenômeno religioso.

Outro objetivo deste trabalho é buscar possíveis conexões dos temas aqui apresentados com a engenharia florestal. Para isso, o recurso utilizado será uma revisão bibliográfica.

Como o uso ritualístico da ayahuasca é uma das únicas religiões autenticamente brasileiras e está intimamente relacionado com a floresta (os constituintes do chá são produtos florestais não madeireiros) a intenção de divulgar este tema para a comunidade científica e para o público em geral é importante. Pois existem muitos tabus e informações erradas sobre os rituais ayahuasqueiros.

Outro objetivo esperado é a constatação do nível de conhecimento público a respeito do uso da ayahuasca e também verificar se algumas idéias que serão apresentadas na revisão de literatura assemelham-se com a opinião pública atual.

Até aqui foram expostos os objetivos específicos. Abaixo está uma lista com os objetivos gerais:

• Mostrar a ligação da natureza com o ser humano numa visão holística;
• Mostrar que a ayahuasca pode contribuir para a consciência ecológica;
• Oferecer uma nova perspectiva ao mundo acadêmico sobre a natureza;
• Incentivar trabalhos que enfoquem este tipo de abordagem onde se encontram: etnobotânica, religião, floresta e meio ambiente.


Florestas Sagradas

Florestas Sagradas

Religiões como o hinduísmo e culturas indígenas norte-americanas acreditam que uma alma permeia todo o universo. Esta alma sagrada imbui os elementos da natureza com um valor espiritual merecedor de respeito e honrarias. Árvores, animais, rios, e rochas representavam forças divinas. Paisagens contendo bosques, nascentes ou rochas, dependendo de crenças específicas inerentes aos povos, podiam ser consideradas manifestações dos deuses, ou consagradas para sua adoração. Um exemplo são as Florestas Sagradas (Sacred Groves), que desde tempos muito antigos e até hoje possuem presença significante nos registros histórico-culturais do homem moderno.

Registros apresentam a árvore como um dos pontos originários de adoração. Segundo Elíade (1949) “os mais arcaicos ‘lugares sagrados’ de que temos conhecimento constituem [...] um microcosmo: paisagem de pedras, de águas e de árvores”. Os antigos santuários possuíam como um de seus elementos a árvore, como ocorria na Ásia e na Grécia.

“Santuários ao ar livre foram os primeiros templos dos deuses. Um lugar sagrado demarcado para uma deidade era chamado de temenos em grego e templum em latim” (CHANDRAN, GADGIL, 2005). A palavra que os celtas usavam para designar santuário possui raízes próximas com a palavra nemus que em latim significa ‘bosque’; existe uma floresta sagrada dedicada à deusa da caça Diana que se chama Nemi (nome que se refere à nemus), este bosque fica pouco distante de Roma (FRAZER, 1982). Na antiga língua germânica (teutônico) a palavra templo também era estreitamente ligada à semântica de floresta.

Assim as florestas e bosques foram utilizados para adorações e dedicados aos deuses. Sua importância sacra poderia ser adquirida quando o ancestral de uma tribo parou sob a sombra das árvores para um descanso ou até mesmo quando um patriarca desapareceu sob as copas das árvores; um grupo de árvores também poderia ser escolhido como um local de culto e para oferecer orações aos antepassados tribais (SÉNE, 2003).

A UNESCO (Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura) reconhece a existência de florestas sagradas em regiões mundiais como: Austrália, Quênia, Filipinas e Líbano (CREWS, 2003). Mas o país com maior índice destes bosques sacros é a Índia. Segundo Swamy et al. (2003) dados indicam a existência de milhares de florestas sagradas em seu solo e estas podem ser consagradas a deuses com forma de serpente, encarnações de Vishnu. Amman (deusa da fertilidade), etc. Nas florestas de Uttara Kannada (Índia) derrubar árvores é um tabu e até mesmo usar folhas e galhos mortos do chão destes bosques sagrados só é permitido se não existirem outras alternativas (CHANDRAN & GADGIL, [s.d.] ).

Na tradição religiosa hindu, as florestas possuem relevância na formação das vilas. Segundo Prime (1996) existem estes três tipos de florestas para os hindus

Shivan: um tipo de floresta que permite manejo e extrativismo.
Maha vana: local que deveria permanecer intacto como santuário natural.
Tapovan: refúgio dos sábios, onde apenas a presença deles nas florestas era capaz de deter ações antiecológicas até de monarcas.

As florestas sagradas não se limitam a sua importância social, religiosa e cultural. Por terem sido preservadas da ação antrópica puderam permanecer intactas, apresentando espécies vegetais e animais que são encontradas apenas nelas (CHANDRAN & GADGIL, [s.d.] ).

O número de florestas sagradas existente hoje é menor que o apresentado no passado, pois quando países como a Índia foram invadidos por culturas diferentes da sua, muitas destas florestas foram destruídas ( SWAMY et al., 2003).

As florestas apresentam seu valor sacro quando dedicadas aos deuses e ao servirem como local de adoração. Para os cientistas, a denotação sagrada é pouco usada para referir-se às florestas, mas a valoração pelos homens da ciência é próxima ao valor dado por aqueles que enxergam o lado sacro das selvas. Sabe-se que o clima, umidade, erosão, fotossíntese e outros processos importantes para a humanidade possuem influência das árvores.


Crenças e Cultos das Florestas

Crenças e Cultos das Florestas

" Quando o homem observava as florestas ao longe, via um imenso manto verde estendendo-se muitas vezes para além do horizonte. Sob o dossel da floresta ele pôde constatar que partes menores formavam aquele manto: as árvores. E observando-as percebeu que possuíam muitas características. Regeneração, longevidade, grandeza, resistência e beleza foram algumas notadas por ele. [...] O homem nessas épocas primárias viu nas árvores forças sobrenaturais, como sua aparente morte no outono e seu ressurgimento na primavera, características que deram expressões simbólicas de poderes divinos, dos quais o homem sentia-se dependente, já que da árvore recebia muito do que necessitava diariamente, enxergando nela o quadro sagrado de seu próprio ser. Esse convencimento formou nas antigas civilizações a origem de antigas mitologias e para muitos uma fé, fé que em algumas novas gerações é manifestada pelo homem, regando a árvore ou ajoelhando-se diante dela" (IMAÑA ENCINAS, 1990).

Alguns destes mitos referem-se à origem do homem. Para os mongóis, a raça celestial vinha de uma árvore atingida por um raio de luz divina e os índios norte americanos, Sioux, criam que o primeiro homem e a primeira mulher eram duas árvores que foram mordidas por uma cobra (FORLONG, 1964).

Quando o umbigo de um recém-nascido caía, na tradição dos Maoris era costume colocá-lo junto de uma árvore, recentemente plantada, para esta ser um tohu oranga, ou o signo da vida para a criança. Em tempos não muito remotos, árvores antigas também representavam famílias, passando por várias gerações. Quando um novo membro da família nascia, um novo espécime era plantado. Até a saúde da planta podia estar relacionada com a saúde de seus donos.

Fazer de um vegetal um parente é um costume comum no oriente, sobretudo na Índia onde alguns ritos literalmente casam um homem ou uma mulher com uma árvore. Na cerimônia a pessoa ficava até horas com a mão encostada no tronco (FRAZER, 1982).

Várias formas de poder eram atribuídas às plantas, como o de conceder fertilidade e proteção às mulheres. Algumas tatuavam galhos, troncos e raízes no abdômen para atrair a gestação desejada e na África a Kigelia africana, com seus frutos parecendo o órgão sexual masculino, estava relacionada com a fertilidade e mulheres lactantes amarravam fitas coloridas em seus galhos para a proteção da criança (CREWS, 2003; SÈNE, 2003 ). O animismo , influência forte no modo de pensar dos antigos, permeava as relações com a natureza. A vida estava em todos objetos da paisagem e certos componentes da natureza eram tratados como seres humanos.

Nas ilhas Molucas , os habitantes consideravam o craveiro-da-índia (Syzygium aromaticum (L.) Merr. et Perry) como se fosse uma mulher grávida: não podia ser assustado com barulhos para não perder os frutos ou para que estes não caíssem prematuramente. O costume japonês responsável pela garantia de produção de frutos era ameaçar algumas frutíferas com palavras rudes do tipo “se você não produzir frutos na próxima safra vou te cortar” (FRAZER, 1982, 1960).

O homem também temia a floresta. A palavra ‘pânico’, de origem latina, refere-se ao deus grego Pã, morador das florestas. O barulho produzido nas matas assustava os transeuntes que atribuíam o som desagradável a Pã (ENCYCLOPEDIA AMERICANA [s/d]).

Uma das referências bibliográficas mais ricas, sobre o culto das árvores, é a encontrada nos livros de James George Frazer (1960, 1982) sendo muito citadas por outros sérios pesquisadores. A extensão de seus livros, além de cobrirem um número enorme de páginas, descrevem as minúcias de crenças e costumes relacionados com o mundo vegetal desde tempos antigos e nas mais diversas regiões. Seguem-se mais alguns exemplos deste professor que detém vários títulos como o de ‘Doutor honoris causa da Universidade de Paris’:

• O respeito e o temor, sentidos em relação à floresta, cresciam mais quando as árvores eram dotadas de alma ou espírito e derrubá-las não era uma tarefa simples. Na África, os Wanica, consideram o coqueiro como uma mãe, pois este lhes dava a vida e comida. Cortá-lo era considerado matricídio.

• Existia também na Europa antiga a crença de que as árvores sentiam dor. Os cortes eram feitos com cuidados cirúrgicos e acreditava-se que quando se cortava um carvalho, podia-se ouvi-lo gritar de dor a quilômetros de distância.

• Em muitos povos, as árvores eram vistas como a casa de alguns espíritos e existia o medo de que se recaísse alguma maldição sobre quem cortasse uma. Os nativos da Indochina, quando sob comando dos franceses, tinham que derrubar alguns bosques. Antes de usarem seus machados, pediam desculpas para as árvores dizendo que só estavam cumprindo ordens e que os verdadeiros responsáveis eram os seus chefes estrangeiros e pediam para os espíritos encontrarem outra morada. O cuidado com tais espíritos era tanto que até a madeira utilizada em construções deveria estar no mesmo sentido da árvore.

Este tipo de crença era compartilhado por outras regiões como na África e onde existiam muitas extensões de floresta, sempre restavam algumas árvores para que os espíritos pudessem ter uma casa e não se zangassem com os indivíduos da tribo. Muitas vezes os sacerdotes eram consultados antes de qualquer intervenção na floresta. Oferendas e sacrifícios, inclusive humanos, realizavam-se para aplacar a ira dos espíritos habitantes das matas ou se conseguir favores. Na Tailândia, ofereciam-se orações pedindo a permanência dos espíritos nas árvores que seriam transformadas em canoa, numa espécie de bênção (ENCYCLOPEDIA AMERICANA, [s/d]).

A magia que permeava principalmente as antigas relações homem-natureza aparentemente não possuía limites. Todas as construções de mitos, ritos e crenças se originavam numa infinidade de formas (tão grande quanto o número de espécies conhecidas em cada época). Se uma árvore fosse considerada com propriedades mágicas sua madeira conservaria estas características. Nesta concepção, a madeira era utilizada para moldar imagens de deuses, cálices, cetros, etc (HUGHES, 1984 apud CHANDRAN, GADGIL, 2005). Muitas espécies possuíam este valor sobrenatural, participando de rituais e consagrando santuários.

Uma espécie muito valorizada durante a história da Europa é o carvalho. O carvalho (Quercus sp.) era respeitado pelos gregos e séculos não apagaram sua opulência podendo ser encontrado, no século XIX, em rituais da Igreja na Rússia (FRAZER, 1982). Os Arcadianos diziam ser originados desta árvore e que as abelhas que voavam nas copas eram seus ancestrais. Os carvalhos participavam de cerimônias com os druidas e eram considerados como oráculos pelos lituanos (até sua religião ser extinguida por povos invasores) (FORLONG, 1964). Outras árvores possuíam papel semelhante. Seguem-se alguns exemplos:

• Amêndoa (Prunus amygdalus): citada na bíblia algumas vezes (como em Números Capítulo 17, versículo 8) foi usada em rituais druídicos e considerada sagrada por povos asiáticos e europeus. Causava encanto por produzir flores sem apresentar folhas em determinadas épocas (FORLONG, 1964).

• Bétula (Betula alba) : considerada árvore da sabedoria. Para os noruegueses relaciona-se com Thunar (Deus trovão). Os russos realizavam rituais próximos à bétula para evocar Leische ,o Deus das florestas, e pedir-lhe bênçãos. (FORLONG, 1964).

• Oliveira (Olea europea L.) : Seus frutos e óleo eram usados em rituais sagrados e mulheres imorais não podiam tocar nesta árvore. Foi o lendário Hércules quem plantou a primeira oliveira em Olímpia. Seus ramos eram usados nas cabeças dos sacerdotes de Zeus (FORLONG, 1964); e os vencedores dos jogos olímpicos também recebiam uma destas coroas. Foi um ramo desta planta que a pomba trouxe a Noé indicando a ‘existência de terra seca’. Supõe-se que a escolha dos ramos de oliveira na bandeira da ONU foi por eles simbolizarem a paz (RHIZOPOULOU, 2004).

Certas árvores possuíam ligações diretas com os deuses. Algumas, segundo a mitologia, eram deuses transformados em plantas como forma de castigo ou prêmio. Alguns exemplos da ligação entre certas espécies e a relação com sua deidade:
  1. Apolo - macieira (Pyrus malus L.)
  2. Artemis - nogueira (Juglans sp.)
  3. Atenas - oliveira (Olea europea L.)
  4. Hera - salgueiro (Salix spp.)
  5. Hércules - álamo (Populus fastigiata)
  6. Isis - sicômoro (Ficus sycomoros)
  7. Pã - pinheiro (Pinus sp.)
  8. Shiva - bel tree (Aegle marmelos)
  9. Zeus - carvalho (Quercus sp.)
O costume de sábios indianos de todas as épocas era viver nas florestas, onde a vida austera que buscavam podia ser encontrada. As árvores eram símbolo de paciência e tolerância e sob elas estavam os melhores lugares para que os mestres pudessem passar seus ensinamentos para os discípulos (PRIME, 1996).

Parte da tradição religiosa envolvendo o reino vegetal e o homem ainda resiste em alguns países. Rituais pedindo bênçãos e de agradecimentos podem ser notados em regiões agrícolas. Na Europa comemora-se o ‘1° de maio’, neste dia passeia-se nos bosques, jovens cantam e passam de casa em casa recebendo vinho e plantando mudas. No dia 23 de abril (dia de São Jorge), há uma procissão em que a figura principal é a personagem ‘Jorge Verde’. Estes rituais estão ligados à chegada da primavera e à fertilidade (FRAZER, 1982; ELIADE 1993).

Além destes costumes, outra expressão religiosa liga-se ao culto da árvore e ainda pode ser observada: as Florestas Sagradas, santuários que resistiram ao tempo e ao homem, por serem consagradas aos deuses.

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